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quarta-feira, 16 de setembro de 2009

EM MEMÓRIA

" Recebí o email abaixo, que relata a morte da estudante, de Heliópolis pela Polícia Militar"
É que mataram um estudante que poderia ser filho de qualquer um de vocês. Com essas palavras, se explicou o motivo dos protestos que seguiram a morte por uma bala perdida de Edson Luis, estudante secundarista, que almoçava no restaurante Calabouço, em 1968. Edson que na época sonhava em virar universitário, já não poderia sonhar com mais nada, diziam os manifestantes na época. É que mataram uma estudante. Ana Cristina E não foi naquela ditadura. Foi agora. Segunda feira. Voltava pra casa. Tinha dezessete anos e deixou uma filha de um ano e oito meses. Se tinha sonhos? Sim, muitos. E isso eu posso dizer com toda certeza. Pois até o semestre passado fora minha aluna. Sentava na promeira fileira. Também falava de continuar estudando, de voltar pra terra natal, falava de amores. Falava e mostrava fotos de sua filha. Escutava com atenção as explicações na aula e tentava produzir o melhor. Agora não vai poder sonhar mais nada. Uma bala perdida que se alojou em seu pescoço tirou tudo isso. Tentou se esconder atrás de um carro, mas não conseguiu.
Mais uma vez entraram na favela atirando.
Agora ouço os helicópteros voando baixo aqui perto. Mais cedo ouvíamos os gritos e barulhos de tiros. Tudo para conter a manifestação de indignação dos moradores do lugar. Aos poucos chegam notícias do gás de pimenta, das bombas. Como moro no Ipiranga, tudo isso é muito perto e ao mesmo tempo muito longe. A distância de um viaduto que nos separa da favela. E tentamos dormir quase em paz.
Antes do recesso, um outro estudante me disse que a polícia está matando demais na favela. Que para dispersar uma festa na rua que atrapalhava o trânsito, junto com balas de borracha usaram balas de verdade, resultando em um morto, outro estudante da mesma escola. E esses estudantes não são martires de nenhuma luta contra ditadura. São meras estatistícas. Números em nossa tão fulgurante democracia republicana.
Sua luta é muito mais dura, pois é cotidiana. Luta por sobreviver, por existir.
A tortura, os assassinatos e a opressão continuam. Mas todos saúdam uma pretensa democraciam e relembram ( mas não muito, que não se deve mexer em certos esqueletos no armário) uma ditadura que segundo eles juram, acabou. Deixemos isso para os livros de história. E um salve para nossos heróis.
E que Heliopólis e seus mortos permaneçam bem longe, depois do viaduto.
Alan Livan
PS: Sei que o que escrevi está muito confuso, mas precisava desabafar. Estou cansado de chorar. Na TV poucas palavras agora a noite em contraposição a uma imensa matéria sobre peixes. Mas no fim pouco disso importa. Ana não está mais aqui. E tudo isso continuará, e cada vez pior!

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