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sexta-feira, 21 de agosto de 2009

MEMÓRIA

À sombra de Raul ou Let me sing my rock and roll
Um olhar sobre a influência que a obra do cantor e compositor Raul Seixas ainda exerce sobre nós, mesmo vinte anos após sua morte
Aldo Gama da Redação
Normalmente, cumprir o percurso do Terminal Princesa Isabel ao Paraíso, de ônibus, às seis da tarde, numa sexta-feira comum, consome cerca de 75 minutos da vida do morador da capital paulista. A irritação e o cansaço das pessoas espremidas é quase tangível. A cada parada, desafiando as leis da física, sobem mais passageiros do que descem. Entalado entre a parede do coletivo e a passageira do lado, uma "ligeiramente" muito acima do peso Sandrinha, caixa do Mercado Campos Elyseos, Carlos Alberto conseguiu retirar seu violão da capa. Colocando o braço do instrumento na vertical, único movimento possível, juntou os dedos da mãos esquerda sobre as cordas de aço enferrujadas e, com uma palhetada seca, arrancou um quase Lá do instrumento. – Eu prefiro sê-êr... Apertados dentro do coletivo, tripulantes e passageiros reagiram de formas distintas. Sandrinha separou as bochechas rechonchudas com um sorriso. Algumas meninas em roupa de colégio riram e aplaudiram. Chico, cobrador do ônibus, fechou os olhos sem forças para pedir silêncio. Adalberto, eletricista, se desesperou e pensou na morte.
* Ana Carolina e Isabela, as meninas de uniforme, não conheciam aquela música. Também é correto afirmar que não conheciam Raul Seixas. Muito menos sabiam que ele a havia gravado em “O dia em que a Terra parou”, de 1978, seu sexto álbum solo. A seu favor, verdade seja dita, as duas podiam utilizar como argumento, no caso de acusadas de ignorância, que a obra havia sido lançada “muito tempo” antes delas terem nascido. E “muito tempo”, nesse caso, significa os 15 anos que separam 1978 de 1993, ano do nascimento das duas. Assim, mesmo evitando eufemismos para a palavra ignorância, é possível afirmar com segurança que as duas desconheciam a música, seu autor e, sem qualquer sombra de dúvida, o voluntarioso, mas desafinado, intérprete. Também desconheciam o significado da palavra “voluntarioso”, o que não afeta em nada os resultados da última rodada do campeonato capixaba de futebol, mas diz algo sobre a qualidade do ensino médio nas escolas públicas paulistas. – ...Essa metamorfose ambulante...
PS: Texto que dedico ao meu afilhado e camarada Flavio de Oliveira Lopes Cerqueira, um dos maiores fãs de Raul que conheço, que não o viu em vida.

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