Woody Allen como intérprete de Sócrates ou a filosofia para e por não-filósofos
Escrito por Marcio Gimenes de Paula
11-Nov-2009
Desde os primórdios da história da filosofia, diversas são as análises e críticas feitas em torno da figura de Sócrates. Aliás, o próprio filósofo, chamado em muitos manuais de filosofia como pai da filosofia, nada deixou escrito e parece, com esta atitude, ter se aberto para múltiplas interpretações da sua atitude filosófica ligada mais ao diálogo do que à escrita. Nesse sentido, tudo o que sabemos a seu respeito são interpretações – muitas e diversas, felizmente.
Numa esteira irônica, mas sem nenhuma pretensão filosófica (ao menos a acadêmica), podemos encontrar uma reflexão e um modo de comunicar curioso: a perspectiva do cineasta e escritor Woody Allen, autor de inúmeros textos e filmes onde o bom humor e a ironia dão sempre o tom. Não dialogaremos aqui com um filósofo acadêmico, pois Allen não é um autor desse tipo, mas com um escritor e cineasta instigante, que sempre pode ajudar a pensar por um novo enfoque, quando já estamos por cair numa linguagem muito técnica e pouco ligada aos problemas filosóficos que parecem existir independentemente da vida acadêmica em filosofia. Em outras palavras, há filosofia fora dos departamentos de filosofia. Talvez até mais filosofia do que neles próprios. Que bom!
Nosso interesse aqui é a análise de um texto específico de Allen, intitulado ‘Na pele de Sócrates’. Em tal trabalho, escrito na forma de um diálogo que, de certa forma, remonta à tradição platônica, existem curiosos e fecundos debates. Contudo, o começo traz o próprio Allen fazendo um elogio a Sócrates e ressalta a sua coragem de morrer pelos seus princípios. Nesse sentido, o escritor afirma que gostaria de ter sido o próprio Sócrates, mas aqui começa também o jocoso: ele ao mesmo tempo se confessa com uma mente não tão especulativa assim, pois só consegue pensar "em bundas de aeromoças e em preços de geladeiras" (ALLEN, 2008, 83) e também não é tão corajoso assim, mas antes tem receio de morrer. Nesse ambiente, o escritor, medroso e pouco especulativo, sonha e se coloca no enredo – ou na pele do próprio Sócrates.
Aparecem dois personagens no diálogo (que na verdade é um sonho): Ágaton e Símias. O primeiro interlocutor começa perguntando a Sócrates (isto é, Woody) como vão os dias de confinamento e ele, numa resposta típica daquelas de um filósofo que não dá importância a isso, diz que o que importa a um filósofo é ter a sua mente livre. Contudo, Ágaton, de forma maldosa, questiona se ele pode então dar umas voltinhas e Sócrates tem que reconhecer que, de fato, está preso. Em outras palavras, toda a verborréia filosófica não é capaz de transformar uma prisão naquilo que ela não é.
Ágaton segue com as notícias desagradáveis e informa a Sócrates que ele foi condenado à morte pelo Senado. Sócrates, ainda com certo otimismo, afirma que lamenta ter levantado tal polêmica. A ironia do interlocutor é, de novo, implacável: não houve polêmica alguma, visto que a decisão foi unânime e em primeiro escrutínio. Aqui há outra notável zombaria com a idéia do rei-filósofo de Platão e com o fato de que Sócrates pudesse ser tal rei. Por isso, para Ágaton, não foi à toa que o Senado ficou irritado com Sócrates.
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